sexta-feira, 11 de julho de 2014

Defesa argentina cala críticos, se recusa a levar gols na Copa e vira o ponto forte

Mascherano é o grande destaque da Argentina
Minutos finais da semifinal de São Paulo. Um jogo com poucas chances de gol, quase nenhuma. Mas a Holanda, finalmente, encontra Robben na posição que ele gosta. O atacante, talvez melhor jogador da Copa, invade a área e prepara o tiro fatal. Mas aparece um corpo voando, um bico de chuteira, e a bola sai para escanteio.

"Pensei que ele ia chutar, pensei que não ia alcançar, pensei que ia travar, pensei um monte de coisas… e graças a Deus ele chutou, graças a Deus eu cheguei, graças a Deus não foi gol".

Quem conta é Javier Mascherano, o homem que salvou o dia argentino na quarta-feira. A travada sobre Robben foi a cereja do bolo após três jogos em que o grande destaque da Argentina foi o jogador menos badalado do Barcelona. Se a primeira fase foi de Messi, o mata-mata foi de Mascherano até agora.

"Foram muitos anos, mas chegou a hora. Nossa bandeira volta a brilhar em uma final do mundo. Só temos que estar à altura das circunstâncias, será o jogo mais importante das nossas carreiras. É um orgulho que nos enche a alma, algo que não podemos explicar", falou o volante argentino.

"Mascherano é nosso líder, trabalha 100% o tempo todo. É o técnico no campo, sempre falando sobre os adversários, posicionamento, parte tática. Quando ele vê que alguém está cansado, ele vai lá cobrir. Não tenho palavras para descrever o que ele significa para a gente", comentou outro dos líderes do time, o lateral Pablo Zabaleta.

Antes da Copa do Mundo e mesmo durante os primeiros jogos, a imprensa mundial analisava a Argentina como uma seleção fortíssima no ataque, com o quarteto formado por Messi, Di María, Aguero e Higuaín, mas pouco confiável atrás. "Precisamos mostrar que somos favoritos, porque ainda não mostramos que somos um time sólido", falou à BBC Brasil o ex-lateral Juan Pablo Sorín, duas semanas antes da abertura.

O ceticismo em relação à defesa ganhou força após os 3 a 2 sobre a Nigéria, no último jogo da fase de grupos. Problemas atrás, Messi resolvendo na frente. Já nas oitavas, contra a Suíça, a Argentina sofreu pouco na defesa, ainda que os suíços pouco tenham buscado o ataque. Para o jogo seguinte, o técnico Alejandro Sabella mudou duas peças: Biglia, um volante mais defensivo, no lugar de Gago, e Demichelis, mais experiente, no lugar de Fernandez na zaga. A lesão de Di María gerou a entrada no time de Enzo Pérez, um jogador que defende mais que ataca.

O fato é que o time mostrou-se compacto e sólido contra Bélgica e Holanda, cedendo raríssimas ocasiões de gol e contando com um Mascherano monstruoso nos momentos de necessidade. "Eles foram muito sólidos, realmente", disse à BBC Brasil o veterano holandês Dirk Kuyt.

"É para calar um pouco as críticas e mostrar que este é um time, não somos quatro ou cinco jogadores", falou o zagueiro Garay, respondendo aos que diziam que a Argentina era pouco mais do que seu quarteto ofensivo.

"A defesa começa com os atacantes, que também estão fazendo as coisas bem", disse Biglia. "Seis jogos, três gols. Se tínhamos sido primeiros nas eliminatórias era também pelo grande trabalho da defesa, e agora estão demonstrando novamente. Só posso agradecer a eles por poder jogar uma final", falou o atacante Higuaín.

Espírito coletivo

O ex-jogador Daniel Passarella, que levantou a taça como capitão em 1978, reconhece que o sistema defensivo está surpreendendo a todos de forma positiva.

"Quando a Argentina finalizou as eliminatórias, todo mundo dizia que o problema era a defesa e o goleiro (Sergio Romero). O goleiro está tendo uma Copa excelente, e a nossa zaga também. Hoje a Argentina tem um time equilibrado, uma zaga mais segura, e Mascherano é o líder do time", analisou no canal Sportv.

Espírito coletivo domina o discurso da seleção argentina

Romero fez duas defesas na disputa de pênaltis contra a Holanda mas, mais que isso, contribuiu com participações essenciais nos jogos do mata-mata. Dando o tom do espírito coletivo que domina o discurso da seleção argentina, ele divide os méritos com todos os outros.

"Eu fico ali embaixo do gol e eles correm, correm, correm. Meu trabalho é não deixar a bola entrar, mas preciso dividir tudo isso com meus companheiros, que se matam em campo. Antes dos pênaltis, Mascherano me disse que 'a história ia mudar', que ia ser meu momento. Me deu muita confiança. O trabalho que estamos fazendo é incrível na defesa, tudo está saindo como planejamos", contou Romero à BBC Brasil.

A Argentina ficou quatro jogos, dos seis que fez, sem tomar gols na Copa. Uma campanha que, de alguma forma, lembra a da Espanha em 2010. Na Copa passada, os espanhóis não tomaram um gol sequer na fase eliminatória do torneio. Na semifinal, fizeram 1 a 0 sobre uma Alemanha que havia marcado quatro contra Inglaterra e a própria Argentina nos jogos anteriores.

É a Alemanha, que não vence uma Copa desde 1990 e uma Eurocopa desde 1996, o último obstáculo para a Argentina, que vive uma fila ainda maior. Ganhou a última Copa em 1986 e a última Copa América em 1993. Os alemães eliminaram os argentinos das últimas duas Copas, sempre na fase de quartas de final.
"É um timaço, que joga de forma formidável, tem técnica, potência, jogo, que fez o que fez com o Brasil. Temos que estar concentrados e não dar espaço, porque com espaço são perigosíssimos", alertou Mascherano.

"Temos trabalhado muito um pelo outro, com linhas compactas. Temos generosidade, espírito, entrega, estamos sólidos taticamente. Não damos espetáculo, mas valorizamos a entrega, o trabalho como equipe, e assim será na final", disse Zabaleta. "Vamos enfrentar um dos melhores times do mundo, mas eles também terão certa preocupação de enfrentar essa Argentina, pois sabem que somos um time de entrega, solidário e com jogadores lá na frente que podem desequilibrar. Sofremos derrotas importantes para eles. Temos que ser honestos e pensar que perdemos porque o rival teve mais mérito, mas agora é uma final, e em uma final tudo pode acontecer."

A Alemanha chega como favorita essencialmente pelos 7 a 1 impostos sobre o Brasil, anfitrião do Mundial. Tem média de 2,8 gols por jogo (fez 17) e já se mostrava avassaladora nas eliminatórias: 36 gols em 10 jogos (3,6 por jogo). No Mundial, é o time que mais trocou passes, com sucesso de 82%.
Contra o Brasil, os alemães encontraram todo o espaço que queriam para fazer o jogo de controle e associações no meio, com Kroos, Schweinsteiger e Khedira alimentando Ozil, Muller e Klose.
Contra a Argentina de Mascherano, a tendência é que não seja tão fácil.

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